Minha esposa é Fisioterapeuta Intensivista e trabalha em CTIs de dois hospitais públicos aqui no Rio de Janeiro e esta semana nos deparamos com uma discussão (no melhor sentido da palavra) sobre uma questão que me deixou profundamente incomodado: o não tratamento do PACIENTE como também sendo CLIENTE nos serviços de saúde em geral.
Podemos definir como Cliente, a “pessoa que tem acesso a um produto ou serviço mediante pagamento” (trecho retirado do site Conceito de Cliente – O que é, Definição e Significado de Cliente). Como os serviços públicos são pagos com o dinheiro arrecadado através dos inúmeros impostos que pagamos, é correto afirmar que estamos sim pagando por eles!
O que ocorre na grande maioria das vezes é a total e irrestrita falta de empatia para com o Paciente (Cliente). Digo isso pois no meio da conversa, surgiu um comentário do tipo “Acho muito ruim esses pacientes que ficam procurando informações na Internet sobre a doença X, Y ou Z. Eles chegam ao hospital achando que sabem mais que os médicos.”.
Vivemos hoje a Era da Informação onde, além de sermos bombardeados a todo instante por novas informações vindas do mundo todo através das Mídias Sociais e canais de notícias, temos ainda a facilidade de pesquisarmos por quaisquer assuntos que tivermos interesse.
E nos casos em que existe alguém próximo, seja ele familiar ou não, com alguma doença grave e precisando de tratamento, esta facilidade torna-se às vezes o único meio que algumas pessoas possuem para conseguirem informações sobre o assunto, já que existe uma inabilidade de modo geral por parte dos profissionais de saúde em transmitirem informações aos Pacientes (Clientes) e familiares de forma que estes tenham um mínimo de entendimento.
Não quero de forma alguma com este texto generalizar dizendo que todos os profissionais de saúde agem desta forma, e muito menos desmerecer todas as profissões relacionadas à saúde, que são de extrema nobreza e seus profissionais dignos de admiração. Quero apenas chamar atenção para a necessidade de maior humanização durante os atendimentos e maior cuidado na forma como se comunicar com o Paciente (Cliente) e seus familiares.
Acredito que um atendimento de qualidade, seja ele em qualquer situação e em qualquer área, deva ser calçado por 4 pilares:
- Empatia – Nos colocar no lugar do outro para buscar entender seus anseios e necessidades;
- Cortesia – Deixar com que o outro se expresse, não o interrompendo, mantendo-se simpático e aberto aos seus questionamentos;
- Clareza de Informações – Ter domínio do que está se “vendendo”, seja um produto, um serviço, ou no caso deste texto, um tratamento médico e, caso o Cliente tenha uma idéia equivocada, conseguir com linguagem simples mostrar que ele está errado e o direcionar corretamente, e
- Qualidade do Produto adquirido ou Serviço contratado – Que hoje em dia é um pilar que não mais se discute, pois é considerado como obrigação, caso contrário a própria empresa ou profissional se exclui do mercado.
Estes quatro pilares funcionam como as quatro pernas de um banco, onde, se uma das pernas for arrancada, o banco fica bambo e corre o risco do Cliente cair de cima dele.
O maior desafio está em saber trabalhar os 4 pilares com qualidade, caso contrário corre-se o risco do Cliente não perceber a experiência de maneira satisfatória.
Continuando na área de saúde, foco desta matéria, tenho abaixo um exemplo real em que alguns destes pilares não foram bem trabalhados (para proteger o médico e o paciente, nenhum nome está sendo citado):
- Um Senhor de 70 anos (vamos chamá-lo aqui de Senhor X), com quadro de enfisema pulmonar e que necessitava de complemento de oxigênio em casa para poder dormir, foi acometido por uma Pneumonia, o que piorou muito seu quadro devido ao aumento da dificuldade respiratória.
- O Senhor X foi então levado ao Hospital com insuficiência respiratória e, chegando lá, o médico verifica a necessidade de entubá-lo, para que o ventilador mecânico pudesse fazer a função de seus pulmões.
- Devido ao quadro avançado de sua doença pulmonar, pouco tempo depois o médico decide realizar o procedimento de Traqueostomia Precoce.
- Acontece que os familiares do Senhor X, buscando informações na Internet, chegaram a um site que informava que este tipo de procedimento era comum e indicado após o 14º dia de intubação e decide não autorizar que o médico realize o procedimento;
- Tentando ajudar, o médico explica que nem tudo que está na internet está correto ou traduz o que se vive na prática e diz aos familiares que “é muito ruim quando pacientes ou familiares buscam estas informações equivocadas na Internet, pois acabam achando que o médico não está fazendo seu trabalho corretamente” e disse a eles que “se o procedimento não for realizado o Senhor X poderá morrer“;
- O médico alcançou seu objetivo, conseguindo convencer os familiares do Senhor X a autorizarem o procedimento, contudo, apesar dele ter saído do Hospital alguns dias depois com seu quadro estabilizado, devido à inabilidade de comunicação do médico, os familiares entraram com uma reclamação formal junto à Diretoria do Hospital contra o médico e sua equipe e saíram com a sensação de não terem sido atendidos satisfatoriamente.
O trabalho do médico foi realizado com qualidade? Tecnicamente sim, afinal de contas o Senhor X saiu do Hospital com vida. Entretanto, arrisco a dizer que apenas este pilar do atendimento – Qualidade do Serviço Contratado – foi realizado. Vamos às análises:
- Empatia – ao dizer aos familiares que “é muito ruim quando pacientes ou familiares buscam estas informações equivocadas na Internet…“, o médico não entendeu a preocupação dos familiares em querer o melhor tratamento possível para o Senho X, não se colocando no lugar deles em sua dor.
- Cortesia – com a mesma afirmação acima, o médico também foi extremamente deselegante e nada cortês, sendo inclusive desrespeitoso com a família.
- Clareza de Informações – ao dizer que “se o procedimento não for realizado o Senhor X poderá morrer”, o médico apenas “jogou o problema no colo” dos familiares, não havendo nenhum aprofundamento de forma a contrapor a informação obtida na Internet por eles.
Sei que o dia-a-dia dos profissionais de saúde, principalmente os que trabalham em Hospitais públicos, é muito estressante, não só devido às superlotações mas também devido às condições de trabalho cada vez mais precárias, mas nada disso justifica não realizar um atendimento de qualidade.
E se o médico tivesse agido de outra forma? E se o médico tivesse dito aos familiares que entende sua preocupação e que realmente as informações que eles buscaram na Internet estão corretas, porém, que no caso específico do Senhor X, devido ao avanço de seu quadro clínico, o procedimento possibilitaria uma maior agilidade em retirá-lo da ventilação mecânica, já que seria feito um “atalho” da via aérea diretamente ao pescoço (à traqueia) e que, apesar de ser um procedimento comum à partir do 14º dia de intubação, neste caso específico, talvez o Senhor X não tenha todo esse tempo e que o ideal seria antecipar este procedimento?
Será que a sensação dos familiares teria sido outra? Será que eles ainda teriam registrado a reclamação sobre o médico junto à Diretoria do Hospital?
Não tenho como responder, mas com certeza o médico teria trabalhado todos os pilares do atendimento e as chances de satisfação teriam sido muito maiores.
Quero me desculpar pelo longo texto, mas sei que este é um assunto muito polêmico, delicado e que precisa de muito debate. Sendo assim, gostaria de convidá-los a colaborarem com a discussão, deixando suas críticas e comentários para que possamos enriquecer este debate.
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Sucesso a todos!